O quarto ao lado
Direção: Pedro Almodóvar | Roteiro Pedro Almodóvar
Elenco: Tilda Swinton, Julianne Moore, John Turturro
Foco na palavra, na interpretação de atrizes brilhantes, sem deixar de lado o primor estético que sempre acompanha Almodóvar
Uma escritora, Ingrid (Julianne Moore) fica sabendo, no lançamento do seu livro, que a sua amiga, jornalista correspondente de guerra Martha, está muito doente.
Afastadas hâ algum tempo, o reencontro faz com que os laços de amizade se fortifiquem e elas começam a se ver frequentemente.
Para Martha, que está solitária no hospital ( ela tem uma filha mas o relacionamento entre elas é carregado de mágoas), esses encontros são um bálsamo, principalmente quando ela fica sabendo que o tratamento experimental a que se submeteu não deu resultado.
Ela compra um remédio de forma ilícita e está decidida a tomá-lo para morrer e evitar o definhamento.
O seu caso é terminal, ela sobrevive com morfina para aguentar a dor e as sequelas da quimioterapia a atordoam, entre elas, o esquecimento frequente e a bipolaridade.
A Morte lhe trará a paz ,mas mesmo decidida, tem medo de ficar só nos seus últimos dias e pede para várias amigas que aceitem acompanhá-la em uma temporada numa casa de campo. O problema é que nos Estados Unidos a eutanásia é crime.
Ingrid aceita essa tarefa porque não quer ver a amiga sofrendo mais ainda...
E aí surge a pergunta: temos direito de antecipar a nossa morte? Num primeiro momento eu não aceitaria a tarefa, mas será que ver quem amamos sofrendo não é o que existe de mais desesperador? Como julgar a decisão de quem sabe que a morte é certa e está sofrendo?
Almodóvar sempre nos colocando em situações escabrosas, complicadas!
O quarto ao lado é um filme forte, arrebatador!
O título se refere à presença das amigas na casa de campo onde elas estão acomodadas em quartos vizinhos e combinam um código para que Ingrid saiba a hora em que a amiga decidiu tomar o tal remédio.
Apesar do tema mórbido, a poesia se faz presente principalmente nas cenas de campo.
O afeto emana entre Ingrid e Martha, num cenário paradisíaco, com as famosas "cores fortes de Almodóvar", uma fotografia magnífica, os sons dos pássaros e uma trilha sonora (de Alberto Iglésias) que dá às cenas um misto de impacto e ternura. Os enquadramentos escolhidos fortalecem o teor poético presente em meio a uma situação tão complexa.
Quem acompanha os filmes do Almodóvar sabe o quanto a música é essencial nos seus trabalhos.
O diretor tem uma genialidade, e sensibilidade ímpar, para falar de sentimentos preciosos em maio às agruras da vida. São personagens intensos, muitas vezes polêmicos, esquisitos, com muitos defeitos, com qualidades, e recheados de humanidade!
Em O Outro Quarto o valor da amizade, da compaixão e do respeito estão presentes de modo tocante!
O que mais me tocou foi a interpretação visceral das atrizes.
Julianne, Ingrid, traz a ternura de quem, mesmo com o coração partido, resolveu ajudar a amiga. Martha com a sua alternância entre serenidade e desesperança, desespero em saber que a morte é iminente (difícil descrever em palavras o quanto Tilda está brilhante). O corpo e a alma de Martha clamam por descanso, o olhar ora vago, desolador, ora sereno.
Uma relação singela e que através das interpretações magistrais das atrizes, apresenta uma simbiose tocante!
Através de um cientista que foi namorado de ambas as mulheres, Almodóvar coloca em questão o quanto o homem está destruindo a natureza e a si mesmo. O que pode parecer panfletário para muitos é, na verdade, um clamor pela sobrevivência na Terra. Ora, cada um tem a sua história de vida e a morte mesmo sendo inevitável, ela pode ser antecipada devido ao descaso para com o meio ambiente! |