Como a própria definição do teatro de Gabriel sugere, o emanar do IMAGINAI, os seus espetáculos impulsionam a nossa capacidade de imaginar. O universo cênico é lúdico cheio de beleza e simbologias.
É o teatro para contemplarmos o belo e a poesia e, a partir daí, refletirmos sobre o homem e o mundo em que vivemos.
Com o Primeiro Hamlet, Villela nos traz mais uma vez a
a essência do teatro: a arte como meio de imaginar, através de uma estética popular, circense, com toques de humor e criatividade. Um teatro épico, instigante.
Os objetos perdem a sua função "real" e ganham inúmeros outros significados no palco e isso é um trunfo porque estabelece com o público um jogo teatral instigante que o leva aprimorar a sua sensibilidade. Prestem atenção, por exemplo, na simbologia da bola ...
Gabriel Villela tem uma equipe que dá consistência ao seu furor criativo.
A harmonia artística entre atores/ diretor/diretor-adjunto/equipe criativa e técnica faz com que tudo seja cuidado nos mínimos detalhes e por esse motivo sempre os espetáculos de Villela têm alta qualidade.
Os dilemas de Hamlet ganham a luz de Wagner Freire, com os figurinos que trazem consigo a alma dos personagens, ora coloridos, ora em tons mais sóbrios, predominantes, para desenhar a inquietude, a ganância que faz um ser matar um parente para conseguir o poder; o tormento do protagonista, o tom angelical de Ofélia que sofre por amor ....
As cenas acontecem em meio a um cenário devastado que recebe os tormentos do protagonista. No palco, elementos ressecados, queimados, num ambiente em ruínas tal qual a alma de Hamlet, tal qual o homem de hoje, num mundo em brasa pós pandemia e tentando sobreviver num caos de desrespeito à natureza, ao próximo, enfim, à vida.
Na Dinamarca do passado, o poder gerando conflitos, mortes e assassinatos. No Brasil e no mundo de hoje, a ânsia pelo poder destrói a Mãe Terra e a ultra-direita ganha voz. Tão atual! Impossível não pensar no terror das enchentes no Rio Grande do Sul, fruto da ganância e do descaso do poder público para com o meio ambiente.
A trilha músical é um deleite e ajuda a tecer a estória. Os atores cantam ao vivo e com muita competência. Os coros são momentos especiais, além das cenas com toques do encanto de Ofélia. O canto é regido com a precisão da preparadora vocal Babaya, que ao lado de Dan Maia (que executa as canções no palco) assina a direção musical.
E claro, um elenco que tem um grande talento para dar vida ao universo mágico de Villela.
Primeiro Hamlet é preciosidade teatral na direção, nos recursos visuais, na música e na interpreta dos atores.
Só conferindo ao espetáculo para se ter a real dimensão de como o elenco é majestoso.
Chico Carvalho e as amarguras de Hamlet, Claudio Fontana, brilhante, como o Rei Claudio que comete assassinato para assumir o poder, exímio na voz e expressão corporal; o olhar de um personagem que não tem muitas entradas, mas que quando está presente domina a cena.
É emblemática, entre tantas, a cena em que Hamlet não mata o tio porque o mesmo está rezando . Um momento que mostra o Rei Claudio sabe muito bem o quanto é tenebroso,
matar, ainda mais o irmão, mas a sede de poder fala mais alto e planejar agora a morte de seu sobrinho Hamlet se faz necessário.
Interpretação majestosa. Prestem atenção na simbologia dos gestos com as mãos... Elias Andreato como o fantasma do pai de Hamlet é uma aula de atuação; Luciana Carnielli também é excelente ... além desses atores, que têm diversos trabalhos com Villela, o elenco também conta com atores jovens e que merecem aplausos(todos seguros no palco).
Ciça de Carvalho é de uma singeleza tocante e no desespero pelas perdas que sofre. Enfim, todos
são fios de ouro que juntos sustentam com louvor uma trama tão conhecida e que ganha vivacidade na visão cênica encantadora de Villela.
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O jogo teatral é instigante. Os atores entregam para o público uma história contada com primor.
Além dos recursos visuais, a encenação apoia-se, amplamente, na atuação do protagonista. Muitos são os personagens previstos na obra (em algumas montagens chegam a uma centena), tantos que muitos atores precisam se desdobrar para dar vida a três ou quatro deles. Mas a preponderância do papel-título é inegável. E a escolha de Chico Carvalho para ocupá-lo, um imenso trunfo.
O diretor @gabriel.villela deixa aflorar, no seu processo de criação, todo o seu conhecimento do teatro, a pureza da arte e da sua alma apaixonada por Minas Gerais, pela cultura popular, pelo circo-teatro e pela roça.
Um trabalho que faz com que o público aprimore a sua capacidade de imaginar e alimente a sua alma com um teatro primoroso!
Saímos do teatro com a certeza de que sonhar acordado é possível. A arte com beleza, poesia e magia é a ponte para um mundo mais harmônico, pois a partir dela refletimos sobre a existência humana, nos divertimos, nos encantamos e podemos agil em prol da paz e do amor. |